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"Falsa intenção" não existe



Semanticamente, a expressão intenção verdadeira é pleonasmo, redundância. Por sua vez, "intensão falsa" é expressão incorreta.

Intenção é uma só, qual seja, o propósito, o intuito, a vontade, o desejo de algo.

Não existe "falsa intenção". Ou há intenção ou não há. A grosso modo, quer ou não quer. "Querer falsamente" não ocorre.

Se não há intenção, não se fala em "falsa", mas inexistência de intenção.

Por outro lado, se há uma intenção (propósito) manifestada e outra intenção (propósito) omitida, ou contraditória com a manifesta, ou, ainda, uma manifesta boa e uma omitida ruim,  todas são verdadeiras, porque co-existem, não se excluem entre si.

Atribuir o valor de falso a algo é a negação do verdadeiro. É o existir x o não existir.  LE toda intenção é um querer, é uma afirmação de algo que existe. Há uma intenção. Existe.

"Intenção falsa" seria algo como um próposito não desejado, um não-propósito, uma negativa de propósito, uma ausência de intenção, do que existe.

Logo, semanticamente, não é possível a construção de intenção-sem-intenção, intenção indesejada (intenção é o desejo necessariamente) ou a chamada "falsa intenção".

Por exemplo, ato simulado de doação, quando é venda, para burlar a tributação. 

A intenção/desejo é de vender. Ao declarar uma doação, não há intenção alguma de doar, ausência de "animus donandi". 

A venda corresponde a intenção ("verdadeira"), pois decorre da presença do "animus vendendi", contudo com uma roupagem jurídica de doação (indesejada). E não "falsa intenção" de doar, mas sem intenção de doar, que é diferente do falso. 

O falso existe imbuído de um valor ilegítimo, digamos, mas existe, formou-se, está revestido de existência, abstrata no caso, no mundo das ideias. O inexistente, por não existir, não pode ser verdadeiro, nem falso, por ordem de prejudicialidade.

Num esquema de exercício lógico, temos

x não existe.
x existe => x pode ser V / x pode ser F.

Infere-se disso que, nesse exemplo, o que pode haver diante da ausência de intenção de doar, uma outra segunda intenção de enganar (o Estado, o Fisco, os órgãos públicos, alguma das partes etc.),  imbuída de "animus decipiendi".

Em suma, concluindo o exemplo, as intenções/vontades seriam a de vender e a de enganar, todas as duas verdadeiras,  e ausente intenção de doar, nem verdadeira, nem falsa, mas inexistente.

Na prática, para dirimir dúvidas, lembre-se de que não há falsa intenção. Num segundo momento, verifique qual(is) "animus" estão presentes.

Voltando ao exemplo, há ânimo de doar? Não. Há ânimo de vender? Sim. Há outros ânimos? Sim, de enganar.

Dessa maneira, no caso exemplificado, observam-se as intenções de vender e de enganar, de doar, não, nem verdadeira, tampouco falsa.

Fiametta F.


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